domingo, 26 de dezembro de 2010

A origem dos nossos temores.


O medo é um dos nossos mais definidos sentimentos experimentados e compartilhados com os animais. Sentimos temor diante de ameaças e adquirimos ao longo da vida experiências que nos tornarão cautelosos, antecipando situações perigosas que podem causar dano ao nosso corpo ou despertar sensações desagradáveis.

Sentir medo na proporção adequada pode ser importante para nossa proteção e funcionamento de nosso corpo. Mas quando são excessivas ou desproporcionais às reais informações do ambiente, podem gerar transtornos psicológicos e sociais.

De acordo com The New York Times , desde 1930 pesquisadores observam que quando certas partes do cérebro de macacos eram lesadas ou removidas, esses animais ficavam sem sentir medo. Ao serem expostos à animais como cobras, demonstraram um comportamento diferente, batendo com uma vara ao redor e assobiavam com a língua.

O experimento foi realizado diversas vezes e um consenso foi estabelecido de que os animais que tiveram a amígdala - uma região do encefalo - removida passavam a não ter medo.

Recentemente a oportunidade de observar o mesmo fenômeno num ser humano ocorreu e o estudo foi publicado no Journal Current Biology.

Segundo o autor do artigo, são raras as oportunidades de estudar pacientes com essa sorte de acometimento. A paciente SM, devido uma doença chamada de proteinose lipóide, apresentou uma lesão focal bilateral da amígdala.

Nos experimentos indutores de medo, como a exposição a cobras e aranhas, a semelhança dos macacos, a senhora SM de 44 anos não demonstrou medo. Segundo o psicológico pesquisador da Universidade do Iwoa Justin Feinstein e os autores da pesquisa, apesar do comportamento ser relativamente benigno, a paciente se expos mais de uma vez a situações de perigo.

Estudar a comportamento desses pacientes pode ajudar a compreender melhor o funcionamento do cérebro e ajudar pessoas com distúrbios do medo, criando terapias ou medicamentos para atuar no funcionamento da amígdala.

Referências:

1) Humans, Like Animals, Behave Fearlessly Without the Amygdala The New York Times de 16 de dezembro de 2010


2) The Human Amygdala and the Induction and Experience of Fear Feinstein, J; Damásio, A; Tranel, D. Current Biology, 16 dez 2010

domingo, 21 de março de 2010

Complexidade Diante dos Olhos IV: Quando começamos a enxergar?



No final da minha especialização em oftalmologia; comecei a me dedicar ao estudo da doença estrabismo. Posso dizer que a grande maioria dos pacientes são crianças; embora muitos adultos sejam assistidos nessa subespecialidade. Desse modo era necessária uma dedicação em oftalmopediatria e dar especial atenção a bebes e crianças.

Todo exame oftalmológico deve medir a visão. Aquela clássica tabela de letras de diferentes tamanhos, que progressivamente diminuem, a ponto de não sabermos se somos capazes de ver todas as letrinhas. Eles servem para medir a nossa capacidade visual e representa para o “oculista” o que o estetoscópio representa para o cardiologista.

Ao conseguir ver um determinado grupo de letras, numa determinada distância; é possível comparar essa resposta a uma resposta da média da população normal; com isso quantificamos a visão de uma pessoa.

Até aqui o meu caro leitor compreende que esse teste simples exige alguns pré-requisitos importantes. Saber identificar e expressar aquilo que lhe foi apontado, o que em última analise requer a integração cognitiva de áreas da memória e da linguagem integradas com a visão.
Surge então um problema.

Como podemos saber se um bebe de 1 mês enxerga?

Essa é uma pergunta rotineira no consultório e que gera alguma apreensão nos pais.
Por conta de uma iniciativa importante da SOCIEDADE BRASILEIRA DE OFTALMOPEDIATRIA ; um teste é realizado em bebes recém-nascido – O teste do reflexo vermelho ou "Teste do Olhinho" – quando é possível diagnosticar precocemente, doenças que comprometem a visão como a catarata e o glaucoma congênito. Assim oftalmologistas recebem muitos bebês para consulta.

Pais felizes com o resultado normal do teste querem muitas vezes saber se seu filho enxerga bem! Nada mais natural, uma vez que lhe é explicado que seu olhinho é normal.

Para responder podemos resumir a questão em dois pontos principais. Desenvolvimento e maturidade (HAMER, 1990). Os olhos de lactentes se desenvolvem e amadurecem do nascimento até por volta dos 5 anos de idade. Um período chamado de plasticidade do sistema visual.
Mas a visão de crianças se desenvolve funcionalmente bem até os 8 meses.

Ao nascimento, eles podem ver aquele grande “E” da tabela, mas isso depende da sua capacidade de focalizar que depende por sua vez dos músculos responsáveis pelo foco chamados músculos ciliares. Esses músculos contraem a pupila.
Fazendo uma analogia com a câmera fotográfica, a pupila é o diafragma da câmera. Desse modo, não é uma incapacidade do filme da máquina – a retina – mas de controlar esse foco na pupila; que é ainda imaturo.

Aos quatro meses essa visão dobra e é possível “ver” até o meio da tabela. Já aos 8 meses, bebes dobram mais uma vez essa capacidade e chegam muito próximos dos adultos (aproximadamente 0,67 do considerado normal).

Sabe-se também que bebês são atraídos por objetos com alto contraste ou preto e branco, por ser mais fácil, mas a capacidade de ver tons intermediários de cinza já é possível no primeiro mês de vida, chegando a uma capacidade próxima do adulto aos 2 meses. Essa capacidade é chamada de sensibilidade ao contraste.

Quanto a visão de cores; com duas semanas podem ser capazes de distinguir o vermelho do verde; mas não tons intermediários como o laranja ou o rosa.
Por volta dos três ou cinco meses, com grande variabilidade, serão capazes de coordenar o movimento dos olhos e perceber os objetos em profundidade. Até então essa capacidade de coordenação deverá amadurecer e bebes com 1 mês são capazes de seguir com os dois olhos um objeto com grande contraste. As imagens são planas e não em 3-D.

Desvios oculares ocasionais devido à imaturidade do sistema são comuns nesse período de amadurecimento. Mas se os pais notarem com muita freqüência os olhos “vagueando” ou desviados deverão procurar um médico.

Há exames objetivos (KANSKI, 2004) para avaliar a visão nesta no primeiro ano de vida como o Potencial Evocado Visual e o Nistagmo Optocinético. São exames baseados na fisiologia da visão e podem fornecer um dado objetivo da presença da visão e sua quantificação. Os oftalmopediatras muitas vezes o utilizam em condições que necessitam de um estudo mais profundo como na presença de doenças.

Agora é possível saber como oftalmologistas pediatras podem inferir sobre a normalidade da visão de um bebes. No entanto somos limitados a responder sobre o processo visual superior, que depende de processos mais complexos e da memória que ira se formar diante das experiências ao longo da vida.
Em resumo. Seu bebe de um mês deverá ser capaz de sorrir para você ao identificar seu rosto, essa é a primeira manifestação de visão.

Referencias:

2) Sociedade Brasileira de Oftalmopediatria: TESTE DO OLHINHO

3) KANSKI, JACK J. Estrabismo – Avaliação clínica.In: Oftalmologia Clínica – Uma abordagem sistemática. Cap.13. pg. 534-535. 4ª.Ed – Revinter.